Yersinia pestis: a bactéria causadora da Peste Negra
Resumo
Yersinia pestis é uma bactéria gram-negativa, altamente patogênica, pertencente à família Enterobacteriaceae. É o agente etiológico da peste, uma zoonose que causou múltiplas pandemias ao longo da história, incluindo a devastadora Peste Negra no século XIV. Este artigo aborda as características biológicas da bactéria, seus mecanismos de infecção, formas clínicas associadas, rotas de transmissão e relevância histórica e epidemiológica.
1. Introdução
Descoberta em 1894 pelo bacteriologista suíço Alexandre Yersin, durante uma epidemia de peste em Hong Kong, Yersinia pestis é uma das bactérias mais letais conhecidas. Apesar de atualmente ser controlável com antibióticos, a bactéria continua sendo uma ameaça potencial em regiões com condições sanitárias precárias e em contextos de bioterrorismo.
2. Características microbiológicas
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Nome científico: Yersinia pestis
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Família: Enterobacteriaceae
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Morfologia: Bacilo gram-negativo, com extremidades arredondadas, medindo cerca de 1–3 µm.
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Temperatura de crescimento: 28–30 °C em meios laboratoriais.
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Transmissão: Via vetorial (pulgas de roedores), aerossóis (forma pneumônica), ou contato com tecidos infectados.
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Reservatórios naturais: Roedores silvestres e urbanos (especialmente Rattus rattus e Rattus norvegicus).
3. Mecanismos de patogenicidade
Yersinia pestis possui diversos fatores de virulência que a tornam extremamente perigosa:
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Cápsula antifagocítica (fração F1): impede a destruição da bactéria por fagócitos.
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Sistema de secreção tipo III: injeta proteínas tóxicas (Yops) diretamente nas células do hospedeiro, inibindo a resposta imune.
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Plasmídeos de virulência: contêm genes que codificam proteínas essenciais para invasão, multiplicação e disseminação.
Esses mecanismos permitem que a bactéria se multiplique rapidamente nos gânglios linfáticos e se espalhe para outros órgãos e a corrente sanguínea.
4. Ciclo de vida e transmissão
A principal via de infecção é a picada de pulgas infectadas, especialmente a Xenopsylla cheopis, que se alimenta de sangue de roedores. Quando um roedor infectado morre, as pulgas buscam outros hospedeiros, inclusive humanos.
Além disso, a forma pneumônica da peste permite transmissão direta entre humanos por meio de gotículas respiratórias — característica que potencializa surtos urbanos.
5. Formas clínicas da infecção por Yersinia pestis
🔹 Peste bubônica
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Mais comum e clássica.
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Caracteriza-se por inchaço dos linfonodos (bubões), febre alta, calafrios e fraqueza.
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Letalidade alta sem tratamento.
🔹 Peste septicêmica
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A bactéria invade diretamente a corrente sanguínea.
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Pode surgir como complicação da forma bubônica ou isoladamente.
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Causa hemorragias internas, necroses e choque séptico.
🔹 Peste pneumônica
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A forma mais grave e contagiosa.
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Atinge os pulmões e pode ser transmitida por aerossóis.
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Mortalidade próxima a 100% se não tratada precocemente.
6. Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico pode ser feito por:
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Exame bacteriológico direto de aspirado de bubões, sangue ou escarro.
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Cultura em meios específicos, como o BHI (Brain Heart Infusion) ou ágar sangue.
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Sorologia (testes rápidos e ELISA).
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PCR para confirmação molecular.
O tratamento de escolha envolve antibióticos, especialmente:
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Estreptomicina
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Gentamicina
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Doxiciclina
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Ciprofloxacina
Quando iniciado nas primeiras 24–48 horas, o prognóstico melhora significativamente.
7. Importância epidemiológica e risco atual
Embora a peste não seja mais uma pandemia global, casos esporádicos ainda ocorrem em países como:
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Madagascar
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República Democrática do Congo
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Peru
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Estados Unidos (sudoeste)
Além disso, devido à sua alta letalidade e possibilidade de disseminação em aerossol, Yersinia pestis é considerada um potencial agente de bioterrorismo, classificada como agente Classe A pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).
8. Conclusão
Yersinia pestis continua sendo um exemplo marcante de como um microrganismo pode moldar o destino de sociedades inteiras. Sua biologia complexa e letalidade elevada exigem vigilância constante, especialmente em áreas de risco. O conhecimento científico sobre essa bactéria é essencial para prevenir novas tragédias como as ocorridas na história medieval.
Referências
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Perry, R. D., & Fetherston, J. D. (1997). Yersinia pestis — Etiologic Agent of Plague. Clinical Microbiology Reviews, 10(1), 35–66.
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World Health Organization. Plague Fact Sheet, 2024.
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Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Plague - Yersinia pestis, 2023.
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Inglesby, T. V. et al. (2000). Plague as a Biological Weapon: Medical and Public Health Management. JAMA, 283(17), 2281–2290.
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